Cuidados Paliativos

Rede Nacional de Cuidados Paliativos: um passo importante no apoio às pessoas com demência e suas famílias

Os Cuidados Paliativos são cuidados de saúde que pretendem intervir ativamente no sofrimento das pessoas com doenças graves, incuráveis e avançadas, bem como no das suas famílias. Trata-se de prestar cuidados de saúde tecnicamente rigorosos, interdisciplinares, ativos, por equipas devidamente qualificadas, seja em ambiente de internamento (hospitais ou outras instituições residenciais para doentes crónicos), seja no domicílio. Destinam-se a pessoas de todas as idades, com patologias oncológicas e não oncológicas, independentemente do prognóstico clínico estimado (que pode ir de anos a meses ou semanas). Devem ser introduzidos precocemente numa situação de doença avançada e não apenas nos últimos dias de vida, sob pena de não conseguirem ajudar plenamente os que deles precisam.

Nesta medida, o numeroso grupo das pessoas com demências ? sejam elas de Alzheimer ou outras ? enquanto pessoas com patologias evolutivas e irreversíveis, deve ter direito a estes cuidados, e estão hoje largamente consensualizados os critérios clínicos que definem essas situações.

Os serviços de saúde modernos devem oferecer respostas nas fases precoces de qualquer doença, devem preocupar-se com as situações de doença aguda, e devem obrigatoriamente incluir respostas para os doentes crónicos e dentre estes, para os que estão em fim de vida (expressão que se refere aos últimos 12 meses de vida). Esta prática assistencial não pode ser desarticulada das outras respostas dos serviços de saúde, sob pena de termos doentes crónicos, que já existem no sistema de saúde, a continuarem a ser tratados como doentes em fase aguda, com respostas desajustadas às suas necessidades, e com as consequentes desumanização, aumento do sofrimento e custos inapropriados.

Nessa medida, era premente avançar com medidas que facilitassem a implementação alargada dos Cuidados Paliativos, e foi aprovada por unanimidade no Parlamento em julho de 2012 a criação da Rede Nacional de Cuidados Paliativos, que entrará em vigor com o Orçamento de Estado de 2013. As diretrizes subjacentes à criação dessa Rede prendem-se basicamente com dois aspetos: a necessidade de consagrar a especificidade desta área de cuidados de saúde – não menorizando nem ignorando a existência de dezenas de milhares de portugueses com necessidade deste tipo de cuidados -, e a necessidade de integrar a prestação destes mesmos cuidados de saúde no âmbito do sistema e do serviço nacional de saúde, numa lógica de maior humanização e eficiência do mesmo.

As mais-valias desta rede são essencialmente de eficiência (cuidar melhor, com mais rigor técnico e humanismo, e com melhor gestão dos recursos), e sobretudo de redução de sofrimento evitável, para muitos milhares de doentes e famílias, que cada vez mais devem conhecer a existência dos cuidados paliativos e solicitar atempadamente o acesso aos mesmos, participando ativamente no processo de decisão sobre a sua doença e nos cuidados de que devem ser alvo.

A rede funcionará de uma forma desburocratizada, com referenciação direta para as estruturas assistenciais e não assente em estruturas intermédias, que implicam uma maior lentidão e desajuste de resposta. Serão diretamente os clínicos a gerir o acesso, em função da disponibilidade de recursos e de propostas de profissionais de saúde, mediante critérios clínicos reconhecidos. De sublinhar que não podemos falar apenas de camas de cuidados paliativos, mas haverá que ter em conta que uma rede só funcionará como tal se integrar equipas de suporte específicas de cuidados paliativos, na comunidade e nos hospitais. Essas estruturas articular-se-ão direta e obrigatoriamente com os recursos dos cuidados de saúde primários e hospitalares, públicos, do setor social e privados.

Além do mais, a legislação que enquadra a Rede Nacional de Cuidados Paliativos, chama a atenção para a importância de se promover o tratamento adequado e proporcionado, que evite maior sofrimento do doente, e censura claramente a prática da obstinação terapêutica.
Está hoje amplamente demonstrado que os Cuidados Paliativos são uma mais-valia para os sistemas de saúde e para a sociedade em geral, e devem ser encarados como um direito inalienável dos doentes. Negar tal facto, é fazer como a avestruz e meter a cabeça na areia, e deixar que muitos doentes sejam tratados de forma menos adequada face às suas necessidades, com os custos humanos, sociais e económicos a que já aludi. É fundamental que os cidadãos estejam informados, se tornem cada vez mais conscientes da existência deste tipo de cuidados, dos seus benefícios e sejam eles próprios e as suas famílias a requerê-los junto dos serviços e dos profissionais de saúde.

Uma sociedade moderna como a nossa será tanto mais desenvolvida quanto melhor atender às necessidades dos mais vulneráveis, como é o caso dos idosos, como é o caso das pessoas com demências. Teremos que cuidar no fim da vida tão bem como cuidamos no início da mesma.

Isabel Galriça Neto
Médica
Diretora da Unidade de Cuidados Paliativos do Hospital da Luz
Deputada do CDS-PP