Segundo as perspetivas epidemiológicas atuais, “estima se que cerca de 5% dos indivíduos com mais de 65 anos sofram de demência, definindo-se um perfil de incremento exponencial com a idade”, adianta Isabel Santana, coordenadora da Consulta de Demência do Serviço de Neurologia dos HUC, indicando que as taxas de prevalência duplicam a cada cinco anos.

A neurologista afirma que, “de acordo com este perfil, e tendo em conta o envelhecimento progressivo da população mundial e o incremento particular do segmento populacional dos muito idosos, estima-se que o número de pacientes com demência venha a duplicar a cada 20 anos, aproximando-se dos 42 milhões em 2020 e dos 81 milhões em 2040”.

De acordo com professora de Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, Portugal é já um dos países mais envelhecidos da Europa e do mundo e as projeções recentes indicam um agravamento desta tendência de envelhecimento, estimando-se que os idosos representam mais de 32% do total da população portuguesa em 2060 (Instituto Nacional de Estatística, 2009).

A também investigadora em doença de Alzheimer dos CHUC refere que, “embora relativamente à demência não existam dados epidemiológicos diretos no nosso país, as estimativas para Portugal, calculadas a partir dos estudos do Sul da Europa, sugerem que existirão aproximadamente 135 mil pacientes com demência e 67-90 mil com doença de Alzheimer”. (Alzheimer Europe, 2010).

“A síndrome demencial é a expressão clínica de uma grande diversidade de entidades patológicas, sendo a doença de Alzheimer a principal causa de demência (mais de 50% dos doentes)”, refere Isabel Santana, salientando estimar-se que a demência vascular represente, isoladamente ou como patologia dual (“demência mista”), mais de 20% dos casos, seguindo-se, por ordem de frequência, outras demências degenerativas, como a demência fronto-temporal, a demência com corpos de Lewy e a demência associada à doença de Parkinson.

Adicionalmente, a especialista afirma que existe “um segundo grupo, composto essencialmente por doenças tratáveis quando diagnosticadas precocemente, que inclui a carência de vitaminas (B12 e ácido fólico), transtornos endocrinológicos (hipo e hipertiroidismo), meningites crónicas e outras patologias potencialmente curáveis do sistema nervoso central (tumores, hematoma subdural e hidrocefalia de pressão normal, entre outras). Apesar de não tão frequentes (menos de 10% dos casos), Isabel Santana indica que “a sua identificação e eventual tratamento são considerados mandatórios, constituindo os objetivos fundamentais da abordagem diagnóstica inicial”.

Principal causa de gastos na saúde acima dos 65 anos
Isabel Santana salienta que o reconhecimento da importância da demência e a necessidade de um projeto estratégico de abordagem desta situação está já consignado no Plano Nacional de Saúde de 2004/2010. A neurologista menciona que, neste documento, as demências são assumidas como a principal causa de gastos na saúde acima dos 65 anos, antecipando-se uma duplicação destes gastos nos 10 anos seguintes.

“Reconhece-se o impacto social e assistencial da demência e a importância do diagnóstico precoce, com uma chamada de atenção para a prioridade na identificação e seguimento de casos de defeito cognitivo ligeiro, como situação pré-demencial e de intervenção precoce”, refere, acrescentando que, finalmente, “é salientada a sobrecarga que o doente com demência representa para as famílias e a necessidade de apoiar o doente e os seus cuidadores”.

Isabel Santana sublinha o facto de a Direção-Geral da Saúde, seguindo o exemplo de alguns países europeus, ter tomado a iniciativa de reunir um conjunto de peritos, liderados pelo Dr. Álvaro Carvalho,
diretor do Programa Nacional de Saúde Mental, no sentido de desenvolver o Plano Nacional de Intervenção em Perturbações Demenciais.

Neste âmbito, a neurologista destaca ainda a implementação, pela Direção-Geral da Saúde, em articulação com a Ordem dos Médicos, da Norma n.º 053/2011 de 27/12/2011: Abordagem Terapêutica das Alterações Cognitivas. Segundo relata, o documento “define as normas de diagnóstico e de orientação terapêutica na demência e propõe uma estratégia mais global de intervenção (holística), que tem como grandes objetivos minorar os défices cognitivos, controlar os sintomas psicológicos associados, potencializar as capacidades funcionais do doente e, deste modo, prolongar o período de funcionamento relativamente preservado e assegurar a qualidade de vida dos pacientes e dos seus cuidadores”.

A especialista termina indicando que “esta estratégia implica uma articulação dos cuidados de saúde primários e dos MF (essenciais na orientação permanente dos seus doentes) e especializados (consultores no diagnóstico e orientação terapêutica mais específica), com a rede de cuidados continuados e/ou paliativos e também com as associações de suporte para familiares”.

Texto original publicado no Jornal Médico, nº 6, setembro 2013

Fonte: Vital Health